Aumentar os juros nesse momento aprofundaria crise econômica e política
A decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de manter a taxa Selic em 14,25% ao ano, confirmando as projeções predominantes dos analistas, é uma demonstração da estreita margem de manobra com que atua o Banco Central nesse momento de aguda crise política e econômica. Sem o controle adequado das contas públicas e com a abertura das comportas que represavam os preços administrados, restou o instrumental monetário para tentar estabilizar a economia brasileira, já em plena recessão. Elevar ainda mais o patamar de juros nesse momento, no entanto, seria aprofundar a crise, em todas as suas dimensões.
No dia em que a cotação do dólar atingiu o maior valor frente ao real em quase trezes anos, o comunicado do Copom pode ser considerado um exercício de equilíbrio em meio às incertezas que cercam a política econômica do governo. Na nota oficial, os integrantes do comitê reafirmam exatamente os termos da decisão anterior, mantendo inalterado o objetivo de trazer a inflação para o centro da meta de 4,5%, no próximo ano. Isso significa que preferiram passar ao largo da estimativa de 5,40% apresentada oficialmente, na última segunda-feira, para a inflação do mesmo período.
A estratégia traçada pelo Banco Central para forçar a convergência da taxa de inflação para o centro da meta, em 2016, está afetada pela rápida deterioração do quadro fiscal. Na entrevista que concederam há dois dias, os ministros do Planejamento, Nelson Barbosa, e da Fazenda, Joaquim Levy, jogaram para 2017 essa ambição de trazer a taxa de inflação oficial para 4,5%. Na prática, portanto, houve um alongamento dos prazos para se atingir o objetivo. A ata do Copom, na próxima semana, poderá elucidar esse desencontro de cenários.
O panorama com que passaram a lidar os integrantes do comitê partiu de um quadro fiscal em franco desequilíbrio, a ponto de o Executivo ter encaminhado ao Congresso uma proposta deficitária para o orçamento do próximo ano. Ao invés de um superávit primário das contas públicas de 0,7% do Produto Interno Bruto (PIB) no próximo ano, conforme previsão de pouco mais de um mês, o governo trabalha agora com um déficit de 0,34%. Mesmo a estimativa de superávit ainda mantida para este ano, da ordem de 0,15% do PIB, está cercada pelo descrédito diante da queda acentuada das receitas tributárias.
A gravidade do quadro fiscal é que explica também a elevação sistemática da cotação do dólar diante do real, que se acelerou ainda mais nos últimos dias. Neste ano, como anotou o portal do G1, a desvalorização do real acumula uma variação de 41%. O mercado antecipa seus movimentos na expectativa de que o país venha a perder o grau de investimento conferido pelas agências internacionais de classificação de risco, justamente pela fragilidade da situação fiscal e a perda de confiança numa trajetória sustentável das contas públicas brasileiras.
Nesse ciclo nada virtuoso em que se encontra a economia brasileira, a manutenção da taxa Selic no patamar extremamente elevado de 14,25% realimenta o desequilíbrio das contas públicas. De acordo com o levantamento da organização Contas Abertas, os gastos autorizados com juros e encargos da dívida para este ano chegam a R$ 277,3 bilhões, embora esse montante ainda possa se elevar pelo impacto desfavorável das operações de swap cambial, que oferecem ao mercado proteção pela desvalorização da moeda. O câmbio em ascensão repercute, por sua vez, no nível de preços, que ronda a casa dos dois dígitos no período de 12 meses, de acordo com o índice oficial de inflação.
Os sinais do Copom, nesse ambiente econômico desfavorável, apontam para a persistência, “por período suficientemente prolongado”, do patamar de 14,5% para a taxa Selic. O consenso entre os analistas é que esse período poderá se estender agora além do segundo trimestre do próximo ano, quando se aguardavam os primeiros movimentos para o declínio da taxa básica de juros. A nova conjuntura econômica, com a maior deterioração fiscal e a elevação do câmbio, é que ditará o tempo em que a economia brasileira poderá afrouxar as fortes restrições monetárias com que convive hoje.
FONTE: G1