Dificultando o Simples?

10/11/2016 08:36

Não há dúvidas de que um dos temas mais comentados e aguardados no mundo empresarial brasileiro no momento é a reforma do Simples Nacional.

Isso porque o regime de tributação mais simples – destinado para a fomentação do empreendedorismo nacional – passará por uma série de mudanças que afetarão milhões de empresas em todo o Brasil.

O Projeto de Lei 125/2015 já havia sido aprovado em votação na Câmara, antes de ser encaminhado para o Senado. Na Casa Alta, o PL passou por algumas alterações em seu texto e foi novamente aprovado entre os deputados. Então, em outubro, ela foi sancionada pelo presidente Michel Temer.

Contribuinte pessimista

E para verificar o que o contribuinte pensa das alterações no regime, o BlogSkill disponibilizou no ar ao longo do mês de outubro uma enquete sobre o Simples Nacional.

Ao final do período de votação, foi possível constatar que a maioria das pessoas não está otimista com as novidades: para 74,4% dos participantes, as mudanças que estão por vir no Simples Nacional vão dificultar a vida das empresas que estão no regime.

Por outro lado, 20% das pessoas que responderam a enquete acreditam que as alterações vão simplificar a vida das companhias integrantes, enquanto que apenas 5,6% julgam que as novas regras serão neutras, ou seja, não mudará em nada a vida das empresas.

Portanto, abaixo, relacionamos a opinião de especialistas a cerca dos principais tópicos da reforma do Simples. Afinal, elas são ou não são positivas? Descubra a seguir:

Limite de faturamento

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Atualmente, as companhias precisam ter um faturamento anual de até R$ 3,6 milhões por ano para aderir ao Simples Nacional. Por meio da proposta de reforma do regime aprovada, esse teto aumentará para R$ 4,8 milhões.

Entretanto, algumas pessoas entendem que esse limite, mesmo sendo ampliado, ainda não será o adequado por conta do tempo em que levará para ser aplicado. “Os benefícios do aumento do teto serão anulados pelo avanço da inflação”, apontou o presidente Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis do Estado de São Paulo (Sescon-SP), Márcio Shimomoto.

Opinião semelhante possui Daniel Santos, diretor técnico do Grupo Skill, empresa especializada em consultoria tributária, fiscal e contábil. Analisando friamente, o teto não é o suficiente. Se aplicar a inflação do período, é preciso ver se os R$ 4,8 milhões não funcionarão apenas uma atualização da inflação, se não seria apenas uma recomposição da perda do poder aquisitivo desse período”, explica.


ICMS e ISS

Além disso, para que fosse aprovado no Senado, o texto-base do PL passou por uma importante alteração no que diz respeito ao teto. Para as empresas que faturam até R$ 3,6 milhões, nada muda. Porém, para as que faturam entre R$ 3,6 milhões e R$ 4,8 milhões, será necessário recolher alguns tributos por fora do Simples – como o ICMS e o ISS.

Esse sistema diferente foi solicitado por estados e municípios, que argumentaram que, de outra maneira, perderiam arrecadação. Isso por que, no regime Simples atual, o recolhimento da guia vai para o governo federal e, então, é feito o repasse para municípios e estados.

Mas isso fará, de certa forma, com que o próprio sentido de simplificação pregado pelo Simples Nacional se perca, já que as empresas dentro desta faixa terão que pagar alguns tributos dentro do regime, enquanto outros impostos seriam pagos a parte da guia do Simples

“As empresas contábeis vão ter um trabalho extra e vai ser difícil para o próprio governo federal controlar o que é pago por dentro e por fora da guia do Simples”, afirma Valdir Pietrobon, diretor político e parlamentar da Fenacon. Vai ter um Simples Estadual e um Simples Federal para quem faturar acima de R$ 3,6 milhões”, prossegue.

Por conta desse cenário, Dênis Carvalho, coordenador contábil da área de Serviços do Grupo Skill, prega cautela para as empresas que possuem um faturamento mais elevado. “Há vantagem justamente para aquelas empresas que não faturam muito. Mas, com as empresas que já estão praticamente mudando, ou seja, saindo do Simples e entrando para um novo regime, o contador ou a pessoa responsável pelo departamento fiscal precisa estar mais atento, afirma. “Se ele não fizer uma boa analise antes de ingressar no Simples Nacional, pode acabar pagando mais tributo”, alerta.

Santos, por sua vez, é ainda mais enfático. “Isso aumenta a carga tributária da empresa. É o Simples não ficando mais simples. Acaba ficando mais complicado porque a empresa passa a recolher os seus tributos, que antes estavam em uma única guia, em até três guias, dependendo do cenário”, diz. “Então, para o contribuinte, causa um aumento de carga tributária. Por isso que, cada vez mais, o Simples não fica simples”, lamenta.

Essa mudança no texto do PL ainda faz surgir outras dúvidas. “Quem tem mais de uma empresa precisa juntar o faturamento de todas as companhias de que é sócio. E se uma delas superar os R$ 3,6 milhões, o recolhimento do ICMS e ISS será por fora para qual delas? Para todas?”, questiona Márcio Shimomoto.


Parcelamento de Débitos e tabelas

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O texto aprovado estabelece ainda uma ampliação de 60 para 120 meses no prazo de parcelamento de débitos do Simples, com redução de multas e juros. Essa medida visa impedir que um número significativo de companhias seja obrigada a deixar o Simples.

Em 2015, para se ter noção, 150 mil empresas foram excluídas do regime por conta de dívidas tributárias.

Para Daniel Santos, entretanto, essa oportunidade, que em um primeiro momento parece excelente, deve ser analisada com cuidado para não se tornar uma dor de cabeça para o contribuinte. “Eu vou falar que é sim uma ajuda, mas deverá ser analisado os juros e multas aplicados nesse parcelamento de 120 meses. No início parece ser interessante, mas no final se torna um peso para a empresa, pois as parcelas ficam muito altas”, afirma.

Já Dênis Carvalho levanta outra questão: o parcelamento vantajoso pode deixar as empresas mal-acostumadas.

“Em longo prazo, isso pode ser um fator prejudicial, já que pode acomodar o contribuinte. Ele pensa ‘o governo vai me dar o benefício, então eu não vou pagar o tributo hoje e lá na frente eu parcelo e tenho um ganho’”, argumenta.

As tabelas do Simples também passarão por mudanças. Hoje em dia, o regime conta com seis tabelas e 20 faixas de faturamento (até os R$ 3,6 milhões), cada uma com sua alíquota específica. Com o novo Simples, serão cinco tabelas e seis faixas, com suas respectivas alíquotas, contemplando até os R$ 4,8 milhões. Nesse caso, ainda haveria um fator redutor para cada uma delas, para tornar a transição entre faixas mais suave.


Investimento-anjo

Outro ponto que merece análise na reforma do Simples diz respeito ao impacto que ela trata para o investimento-anjo no Brasil.

Uma vez aprovado o PL, as novas empresas não poderão ser excluídas do regime ao receberem esse tipo de aporte financeiro. Com isso, espera-se que os negócios recém-inaugurados possam ter mais tempo de desenvolvimento antes de deixarem o regime mais simples de tributação.

O texto-base prevê que o investidor-anjo não poderá ser considerado um sócio da empresa em que investir e não terá poderes de gerência ou voto na sua administração. Ele também não poderá responder por dívida da companhia, incluindo casos de recuperação judicial, e será remunerado por seus aportes pelo prazo máximo de cinco anos.

Dessa maneira, esse tipo de investidor não terá mais a responsabilidade e ônus por eventuais passivos da empresa

Para Carvalho, essa “é uma forma de o governo regularizar uma nova atividade de pessoas que querem investir, mas que não querem ter aquela preocupação de fazer parte do quadro societário da empresa”.

Outro ponto destacado do PL é que os valores destinados de investidor para empresa não serão considerados receitas da sociedade. Com isso, o aporte de um anjo não será tributado como receita da empresa.


Pé no Freio

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Em linhas gerais, Dênis Carvalho julga que o novo Simples Nacional conta com aspectos positivos e aspectos negativos, que podem fazer com que outros regimes, como Lucro Presumido e o Lucro Real, sejam melhores.

“Aquelas empresas que querem ingressar no Simples precisam fazer uma analise se realmente haverá um ganho na tributação e verificar como esta a média de faturamento anual da empresa. Da faixa 1 até a faixa 5, há um valor de imposto legal que vai ajudar as empresas optantes. Mas, a partir da faixa 6, o valor do imposto poderá ter um aumento relevante e se tornar prejudicial. Logo, é interessante a empresa projetar se a faixa de faturamento dela está aumentando a cada mês e, se ela achar que vai estourar o limite ou que vai passar a ficar na faixa 6, verificar a possibilidade de um Lucro Presumido ou até um Lucro Real”  [leia mais aqui], orienta.

“O contribuinte deve seguir no Simples, mas com o pé no freio. Se ele achar que não vai dar para permanecer no regime, pisa no freio e pega uma via alternativa, porque senão lá na frente pode acabar pagando mais tributo”, conclui.

 

Fonte: Blog Skill